Após 25 anos do caso ET de Varginha, cidade aposta no turismo ufológico
21º32'S, 45º26'O
Memorial do ET
Vila Paiva, Varginha, Minas Gerais
Deu até no Wall Street Journal: "Em um passeio à tarde de sábado em janeiro, um trio de moças decidiu pegar um atalho para casa através de um terreno baldio. Em uma moita, as três disseram, elas encontraram uma criatura igual a nada que tinham visto antes."
"'Não era um homem ou um animal, era algo diferente', disse uma das mulheres, Kátia Andrade. O ser tinha pele oleosa e morena e membros elásticos, contou. Três protuberâncias arredondadas brotaram de sua cabeça superdimensionada. Destacando-se de uma maneira diferente estava o odor da criatura: um cheiro horrível enfraqueceu os joelhos."
De repente, o Sul de Minas estava nas páginas de um dos mais tradicionais e conservadores jornais de economia e negócios do mundo. E bem antes de ele ser comprado por Rubert Murdoch, ampliar a gama de assuntos que tratados dar espaço para artigos opinativos que dizem que aquecimento global é uma invenção.
Tudo começou em janeiro de 1996. Kátia Andrade Xavier e as irmãs Liliane de Fátima Silva e Valquíria Aparecida Silva alegaram ter visto uma criatura misteriosa e estranha, cuja identidade é incerta até hoje.
Mas, no imaginário coletivo, o personagem tem nome, sobrenome e o peso de ter sido um dos grandes ícones nacionais da década: Etê de Varginha, muito prazer. "Foi a sensação do ano", escreveu Silvio Essinger no Almanaque Anos 90, para não me deixar mentir.
Kátia gritou, as irmãs avistaram o ser agachado, com manchas que pareciam veias. A história delas tornou o caso famoso na mídia, transformando-as em um tipo peculiar de "pastorinhas de Fátima" da ufologia. Só que o relato das três é um pedaço da rave alien que parecia estar rolando em Varginha.
Alguns livros estrangeiros se debruçaram no assunto. O famoso ufólogo brasileiro Ademar José Gevaerd, fundador e editor da revista UFO, é citado no livro UFO's – The Great Last Days Deception ("óvnis – a grande decepção dos últimos dias", sem edição no Brasil), de Billy Crone. Crone é um pastor americano, celebridade de YouTube e prolífico autor, cujos livros tratam ou da aniquilação da humanidade por diversos meios (inteligência artificial, engenharia genética, radiofrequência, drones, wicca…) ou da verdade sobre os dinossauros ("uma lavagem cerebral evolucionista"). Para Crone, a ufologia é uma religião do século 21, em que as pessoas creem que serão salvas por aliens, não por Deus.
Tudo isso para falar que o caso de Varginha ficou tão grande que até detratores notórios de tudo que envolve a possibilidade de vida extraterrestre dedicaram tempo e espaço em seus livros a ele. De volta ao relato de Gevaerd, segundo o pastor antialiens Crone:
"É um fato, confirmamos e checamos que um alienígena foi capturado na manhã daquele dia, um sábado, cerca de 10h30, pelos bombeiros e alguns militares. Outra criatura foi vista no mesmo dia, mas no meio da tarde, por três garotas. Isso chamou a atenção de toda a cidade, elas dizendo que tinham visto o diabo."
"Naquela noite, sábado, 20 de janeiro de 1996, a segunda criatura, provavelmente a mesma vista pelas meninas, foi capturada por uma viatura da polícia militar. Vinte e cinco dias depois, Marco Chereze, o policial que viu e pegou a criatura com as próprias mãos, morreu por causa de alguma bactéria, mostrando que seu sistema de imunodeficiência estava totalmente destruído."
O suposto ET foi levado para um posto de saúde da cidade e, em seguida, os policiais o levaram para o Hospital Regional de Varginha. Na sequência, a criatura passou pelo Hospital Humanitas e dois dias depois teria ido para a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Até hoje, a versão contada nunca foi confirmada pelas instituições. É tudo especulação, verdade de boteco.
Nos primeiros meses após o ocorrido, os hotéis da cidade ficaram cheios. "A cidade é hoje passagem obrigatória de ufólogos e esotéricos, que antes preferiam as vizinhas São Tomé das Letras e Poços de Caldas", escreveu, em agosto de 1996, Rodrigo Vergara na Folha de S.Paulo.
A onda passou, houve algumas tentativas de reviver o assunto nos anos 2010, mas nada muito concreto. Apesar disso, o cidadão honorário e extraterreno de Varginha seguiu vivo na memória afetiva brasileira.
Hoje, a prefeitura da cidade quer turbinar o turismo com o insólito episódio. Pretende adquirir o terreno onde as meninas teriam feito contato para preservá-lo, além de rechear o Memorial do ET e fazer mais seis esculturas de alien em tamanho "natural".
Atualmente, Varginha já tem uma estátua de alien e um reservatório de água em forma de disco voador. O memorial – uma nave e um foguete de 10 m de altura – começou a ser construído em 2010 e ainda não foi concluído. O plano da prefeitura é usar o espaço para exibição de documentários de ufologia, jogos inspirados no caso e feiras de artesanato local, além de um planetário inflável.
Gleiber Antônio Piva, artista plástico e funcionário da secretaria de turismo de Varginha, me explicou que a ideia é criar uma rota do ET na cidade, conectando os pontos da suposta aparição, as estátuas, o monumento e o memorial.
O episódio do ET pode ter dado notoriedade a Varginha na comunidade ufológica global, mas isso não se converteu em uma massa de turistas desembarcando na cidade, a não ser nos primeiros meses de 1996. Antes e depois, o que movimenta o turismo da cidade para valer são os negócios, especialmente o café.
Mas Gleiber, que está no momento desenvolvendo as novas estátuas, sabe que o misterioso ser de 1,60 m de altura e cabeça diferenciada é um marketing chamativo para Varginha. Cada visitante, desse planeta mesmo, que chegar e ficar uns diazinhos a mais pode conhecer outros atrativos da região, gastar mais em restaurantes, hotéis e por aí vai.
É uma tendência vista em outros países. Locais de avistamento em países como Chile, Japão, Sri Lanka e Rússia têm investido no turismo ufológico. Há 30 anos as cidades no entorno da Área 51, nos Estados Unidos, se beneficiam de viajantes que querem conhecer a base militar que preservaria óvnis e seres extraterrestres.
Se der certo, Minas entraria de vez na rota. Quem precisa de Roswell quando temos Varginha?
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