Boia no meio do mar é um dos lugares mais visitados do mundo. Ou quase isso
0º00', 0º00'
Ilha Nula
Golfo da Guiné
Provavelmente você já esteve lá, mesmo que não soubesse. Eu fui diversas vezes e não gostei, especialmente porque sabia que não estava lá, embora a câmera do celular insistisse em dizer que sim. É assim com todo mundo que pisou, virtualmente, no que é o lugar que não existe mais visitado do mundo: a Ilha Nula.
Nesses casos, não é memória de bêbado, mas erro tecnológico mesmo. Acontece quando o sistema de geocodificação do celular dá pau. Trata-se de uma função executada em um sistema de informação geográfica (SIG), a mesma que pega dados que contêm endereços e os converte em coordenadas geográficas, para serem mapeados.
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Por exemplo, usemos as coordenadas 23°00'35.2″S 43°19'32.8″O (ou -23.009783, -43.325789, em graus decimais). Elas correspondem ao número 58 da rua C, dentro de um condomínio situado no número 3.100 da avenida Lúcio Costa, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, RJ.
Se você fizer uma selfie nessa rua e o geotagueamento estiver desligado ou se for um software mal feito, ele registrará uma informação nula para as coordenadas, zero para latitude, zero para longitude, ou seja, 0°, 0°. O problema é que esses zeros não são nulos no mundo real.
Um programa bem escrito saberia ignorar essa falta de informação geográfica e beleza, bola para frente. Mas uma penca de geotagueamentos errados marcaram zilhões de fotos, check-ins etc. dessa forma, nessa localidade 0°, 0°. E então, aquela sua foto lacradora na frente de uma tão falada portaria (ou de um triplex num litoral mais ao sul, se preferir) pode acabar marcada como tendo sido feita em 0°, 0°.
E o que há em 0°, 0°? É o encontro da Linha do Equador com o Meridiano de Greenwich. E é onde está a fictícia Ilha Nula. Ela teria sido criada em 2011 no Natural Earth, um banco de dados cartográficos em domínio público, como um pedaço de terra de um metro quadrado. Sua função é auxiliar analistas de SIG a localizar mais facilmente erros de geolocalização.
Desde então, a Ilha Nula virou uma piada que ganhou um mapa fictício, além de bandeira, adesivo, camiseta… Tudo inspirado na única coisa que de fato existe em 0°, 0°: uma boia. A estação 13010-Soul faz parte do sistema Pirata, programa desenvolvido por Brasil, França e Estados Unidos que analisa as interações entre o Atlântico e a atmosfera e sua influência no clima.
Beleza, é uma boia com respeitável importância científica, mas não tem lá muito apelo. Se ela não é o melhor argumento para atrair alguém ao Golfo da Guiné, pelo menos o cruzamento do Equador com Greenwich fica a cerca de 500 km ao sul da bela costa de Gana, que tem uma série de fortes erigidos pelas outrora potências marítimas europeias (Portugal, Holanda e Reino Unido) e outras nem tão potentes assim (Dinamarca e Suécia).
A leste, o arquipélago de São Tomé e Príncipe, segundo menor país africano, fica a uns 700 km da Ilha Nula. É um destino abençoado por praias e florestas imaculadas.
Há voos regulares entre Acra, capital ganense, e São Tomé. Pronto, temos um roteiro que inclui dois países da África Ocidental e uma ilha que não existe. Se for, me convide.
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