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Terra à vista!

O que Batman, na Turquia, tem a ver com o Batman, aquele de Gotham?

Felipe van Deursen

07/12/2019 04h00

Centro de Batman: pouco turístico (foto: wikimedia commons)

37º53'N, 41º07'L
Batman
Batman, Turquia

Nada. Batman é uma cidade no sudeste da Turquia, em uma região de montanhas escarpadas, cachoeiras e flores silvestres, com cavernas e algumas das ruínas arqueológicas mais antigas do mundo.

 

Ruínas de Hasankeyf (Getty Images)

Mas, apesar de a Turquia ser um peso-pesado de primeira grandeza no quesito "Quem tem mais coisas velhas do que eu?", ela perde para os novatos Estados Unidos, berço do Batman. O herói da DC é mais velho.

"Novatos" naquelas também. Nem só de dinossauros vive o passado profundo dos EUA: o sítio de terraplanagem Poverty Point, na Louisiana, um tesouro que marca a pré-história da América, é mais ou menos da mesma época em que Bizâncio foi fundada, no século 8 a.C.

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Em todo caso, a DC Comics é a mais velha no jogo. O homem-morcego, como as turbas nerds que nestes primeiros dias de dezembro se acotovelam na CCXP para ganhar brindes bem sabem, completou 80 anos em 2019.

Quando o número 27 da Detective Comics chegou às bancas e apresentou Bruce Wayne ao mundo, em 1939, a cidade da qual estamos falando chamava-se Iluh e era, como vinha sendo pelos séculos anteriores, um vilarejo perdido e sem destaque econômico ou cultural.

Na década de 1940, quando Gotham já conhecia Mulher-Gato, Coringa, Pinguim, Espantalho e Duas Caras, Iluh se transformou. Praticamente da noite para o dia, graças à descoberta do maior campo de petróleo da Turquia a apenas dois quilômetros de distância, ela virou uma cidade dinâmica, cuja população crescia vertiginosamente.

Em 1957, enquanto Batman derrotava o vilão Signalman nos quadrinhos, Iluh ganhou um novo nome: Batman. Santa criatividade! Mas nada a ver com o Morcegão. A cidade ganhou o nome por causa do rio que passa ali, Batman. Batman também é o nome da província onde ela fica.

O rio, um afluente do Tigre, também não deve nada a Bob Kane e Bill Finger. Antigamente, ele era chamado de Nymphios ("noiva" em grego) ou de Sâtîdamâ ("sangrento", em árabe, devido às batalhas ocorridas em suas margens).

No século 19, o rio passou a ser chamado de Batman. O novo nome era possivelmente um encurtamento de Bati Raman, uma montanha das redondezas. Outra hipótese sugere que o rio foi nomeado assim por causa de uma antiga unidade de medida otomana, o batman. Um batman equivale a pouco menos de 7,7 kg (sendo assim, o Batman pesa uns 12 batman).

Batman, a cidade, se desenvolveu à medida em que seu xará playboy problemático virava um ícone da cultura pop em todas as mídias possíveis. Mas os cerca de 500 km de oleodutos que ligam Batman ao porto mediterrâneo de Iskenderum, o diversificado parque industrial e todo o dinheiro que afluiu não ajudaram o outrora sonolento vilarejo a se tornar um município interessante.

Saindo de Batman (foto: Flickr)

Guias de turismo da região se referem a ela como uma cidade moderna sem charme. O maior atrativo parece ser mesmo o nome.

De olho nisso, em 2008, ano em que o Coringa de Heath Ledger conquistou o mundo e uma overdose de remédios deixou o mundo sem Heath Ledger, o prefeito de Batman, Huseyin Kalkan, anunciou à imprensa que planejava processar a Warner Bros. e o diretor da trilogia, Christopher Nolan, por usarem o nome da cidade sem a informar.

"Só existe uma Batman no mundo", ele disse à época, ignorando veementemente um vilarejo a 800 km de distância, no Irã, que também se chama Batman. Claramente foi uma jogada de marketing, e o holofote do comissário Gordon voltou-se para a Turquia. O prefeito conseguiu a atenção que queria.

Uma petição quer mudar o mapa de Batman

Dez anos e Ben Affleck depois, Kemal Atakan Kırca, cidadão de Batman, criou uma petição para que as divisas da província de Batman adquirissem os contornos do batsinal. Nada mais justo, ainda mais em uma internet atolada de petições absurdas. O abaixo-assinado ainda está aberto e conta com 26 mil assinaturas.

Assine, caso você queira ser um Harvey Dent e fazer a diferença. Mesmo que à sua maneira.

Sobre o autor

Felipe van Deursen é jornalista de história. Autor do livro 3 Mil Anos de Guerra (Ed. Abril), foi editor da Superinteressante e da Mundo Estranho e colunista da Cosmopolitan. Gosta de batata, de estudar e de viajar.

Sobre o blog

Os lugares mais curiosos e surpreendentes do mundo e a história (nem sempre tão bela nem tão ensolarada) que cada um deles guarda. Um blog para quem gosta de saber onde está pisando.