A igreja e demais cenários de "Dark" que existem – em 2020 e em outros anos
52º23'N, 13º10'L
Cemitério Sudoeste de Stahnsdorf
Potsdam-Mittelmark, Brandemburgo, Alemanha
"Stranger Things é bom, mas você já viu Dark?". Se você tem Netflix em casa, talvez já tenha ouvido tal comparação. Para os fãs convertidos, a frase é até velha, poderia ser dita em 1986 ou 1953.
Para os não-iniciados: Dark é uma série de ficção científica baseada no desaparecimento de um menino que desencadeia uma série de acontecimentos estranhos, conectando quatro famílias que, aos poucos, são afetadas por viagens no tempo. A terceira e última temporada estreou neste sábado, 27 de junho de 2020, dia importantíssimo na trama desse bem-sucedido suspense alemão, que faz sucesso justamente por explorar o conceito de viagem no tempo sem tratar o público feito uma ameba (como alguns filmes de heróis).
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Mas, além da ficção científica, Dark tem outros trunfos. Um deles são as locações.
A série se passa na fictícia Winden, cidade que reúne um combo de características de suspense. Pequena, rodeada por uma floresta com cavernas e com uma usina nuclear. Adicional cronológico de frio na barriga: se passa nos anos 80 (pelo menos em parte). Adicional geográfico de frio na barriga: fica na Alemanha, ou melhor, nos bosques da Alemanha.
De fato, existe uma vila chamada Winden im Elztal, em Emmendingen, no estado de Baden-Württenberg, sudoeste do país. Ela é rodeada pela Floresta Negra, cenário do romance gótico O Necromante, clássico de 1792 e lugar-comum no imaginário sinistro dos contos de fadas – embora as florestas mais inspiradoras nesse quesito, que inclusive povoaram a mente dos Irmãos Grimm, sejam as de Reinhardswald, no centro da Alemanha.
Mas os criadores da série já falaram que a Winden de Dark não existe. "Nós deliberadamente queríamos uma cidade fictícia porque não queríamos dar a ela uma cor bávara ou do norte da Alemanha. Queríamos que ela pudesse ser em qualquer lugar", explicou a cocriadora e roteirista Jantje Friese à revista inglesa Radio Times.
Dark foi filmada, surpreendentemente, nos arredores de Berlim. "Assim que você sai do centro da cidade, em alguns minutos ela já vira uma vila", disse Friese. Aquela floresta de coníferas que assombra os personagens, guarda tantos mistérios e que parece perdida, longe da civilização, apesar da usina nuclear, se chama Düppeler e fica a apenas uma hora da Alexanderplatz – de transporte público.
Na mesma região fica a igreja de madeira que aparece em vários momentos cruciais, muitos envolvendo o funéreo padre Noah. É a capela do Cemitério de Stahnsdorf, município de 15 mil habitantes no estado de Brandemburgo. Trata-se de um enorme e importante cemitério, dois adjetivos possibilitados, justamente, porque ele fica nos arredores da capital. Suficientemente perto, mas com espaço para crescer.
Na segunda metade do século 19, com o forte crescimento populacional de Berlim (a cidade saltou de 170 mil habitantes, em 1800, para 1,8 milhão, em 1900), ficou clara a escassez de covas disponíveis. Disso, surgiram cemitérios grandes e expansíveis nas cercanias. Um deles foi o Cemitério Sudoeste de Stahnsdorf (Südwestkirchhof Stahnsdorf), inaugurado em 1909. A capela, em estilo norueguês e com vitrais art nouveau, é de 1911.
A necrópole logo ganhou uma conexão ao S-Bahn, sistema metroviário que atende Berlim e arredores. Essa linha filial, que partia da estação de Wannsee, chamava-se Friedhofsbahn, ou "o trem do cemitério". Pudera. Além de parentes enlutados, ela também transportava caixões.
Como tudo que envolve a Alemanha, as grandes guerras impactaram brutalmente o Stahnsdorf. Após a Primeira, o Reino Unido e a Itália adquiriram terras adjacentes para enterrar seus homens mortos em solo dominado pelos alemães. Ao final da Segunda, a linha de trem foi destruída.
Com a divisão da Alemanha, o cemitério passou a ser localizado na Alemanha Oriental e os cidadãos de Berlim Ocidental só poderiam visitá-lo com um passe especial. Após a construção do Muro de Berlim, em 1961, a ligação de trem entre o Stahnsdorf e a capital foi definitivamente encerrada.
É nessas ruínas ferroviárias, no meio da floresta, que fica a linha de trem que o núcleo jovem da série explora algumas vezes. Já a caverna, marco zero de todos os mistérios de Winden, infelizmente é cenográfica. Mas todo o resto está lá. O bosque, a linha de trem largada e até aquele viaduto que parece ligar nada a lugar nenhum.
O que você vê hoje lá são trilhas que, no século 19, eram usadas por militares que faziam a travessia entre Berlim e Potsdam, ali pertinho. Ou seja, se você quiser visitar a cidade histórica que sediou a famosa conferência que definiu os rumos do pós-Segunda Guerra, dá para emendar com os cenários de Dark.
Só não espere encontrar a usina nuclear. Não existe nenhuma em funcionamento perto de Berlim (e, em alguns anos, em todo o país). A de Rheinsberg, uma hora ao norte da capital, já foi orgulho tecnológico da Alemanha Oriental. Mas fechou com a reunificação.
Então, para um roteiro completo de Dark, inclua 1986 – e outros anos. Afinal, tão importante quanto o "onde" é o "quando".
O blog de viagem alemão Fotostrasse fez um roteiro com locações de Dark, que inclui ainda a escola e o sanatório. Tem dicas boas lá, em inglês
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